Pesquisar este blog

quarta-feira, 3 de junho de 2020

O ano em que Madri se tornou Nottingham

Ao fim de mais uma temporada vitoriosa, em meio a todas as críticas de um fracasso europeu, ficara em cheque a permanência de Castro no Notts County. Como visto no último texto, apesar da renovação se estender por muito tempo, ela teve um final feliz. Entretanto, duas semanas após a assinatura do vínculo, o Manchester City ofereceu um contrato 438% maior a Castro - uma hecatombe em Nottingham.

Entre tantas polêmicas, Castro ratificou sua permanência dias depois da proposta. E uma história foi contada 10 meses depois, em coletiva de imprensa na final da Champions League.

Fato revelado após a conquista do título da Champions League, segundo da história do clube, o primeiro passo foi uma reunião secreta entre Castro, a nova comissão técnica e o elenco. Formada por ex-atletas, a relação de empatia entre comandantes e comandados nasceu naturalmente após uma longa conversa na casa de Bjarnason, em Akureyri, Islândia. Bjarnason, recém-aposentado, colocou-se a frente e, segundo relatos, emocionou os ex-companheiros de campo. O primeiro comprometimento foi a manutenção do elenco, mantendo quase todos os jogadores da temporada 2023/24. Assim, o Notts voltaria com um time muito entrosado para a temporada 2024/2025 - os 11 titulares eram os mesmos que faturaram o tricampeonato inglês. Porém, muito mais do que isso, um vestiário absolutamente unido num só propósito - vencer juntos. Além disso, seria a última temporada de Hummels, David Silva e Ramsey como profissionais do futebol e o último capítulo deles precisaria ser nada menos que épico.

Castro nunca sairia de Nottingham com essas condições.

E foi épico! O Notts County tornou-se tetracampeão inglês - existindo desde 1888/1889, o Inglaterra nunca havia visto um clube campeão por quatro vezes consecutivas. Jamais! E foi muito épico! O topo do futebol europeu foi reconquistado, tomando a capital espanhola para si por quatro vezes, exorcizando o monstro catalão e com uma campanha invicta e, especialmente, com um toque feito dentro de casa.


O ELENCO

A última temporada havia sido absolutamente focada nas grandes estrelas. A estratégia, corroborada entre elenco, comissão e diretoria, era agora claramente corrigir a rota e trazer equilíbrio ao elenco - sem se desfazer das principais peças.

O orçamento para contratações era de £250MM, maior budget entre todos os times da primeira divisão. E mesmo assim, Castro optou por ser cirúrgico e econômico na gestão desta verba.

As perdas no início foram fruto das aposentadorias - Foster, Tootle, N'Gala e Bjarnason penduraram as chuteiras e se juntaram à comissão técnica; e Alexis parou e retornou ao Chile para iniciar seu pós-carreira. Entre as vendas, Saliba foi para o Valencia, porém com cláusula de recompra; Lucas Moura mudou-se para Londres, para ser titular do West Ham; e Kross retornou à Alemanha para os últimos anos da vitoriosa carreira. Chegaram, em contrapartida, três atletas para composição de elenco: Chamberlain, Havertz e Sczcesny.

Aliás, seria o encontro dos irmãos Oxlade-Chamberlain - Alex,vindo do Liverpool e Christian, que já iria para o seu sétimo ano sob as cores do Notts.

Todo o restante do elenco foi preenchido por jogadores da base, com destaque para Edson Reis, a jóia brasileira descoberta em Santos e que, predestinado, marcou seus dois primeiros gols em Anfield, no jogo que definiu o título para os Magpies. Isso sem falar em Gbagho...

Elenco 2024/2025:

Goleiros: Schofield, Schmeichel e Sczcesny;
Laterais: TAA, Hakimi, Chamberlain, Nygard¹, Alaba, Tagliafico, Evina e Arnaiz¹;
Zagueiros: Hummels, De Ligt, Virgil, Brown¹ e Bird;
Meio-campistas: Tonali, De Jong, James, Rose, Ramsey, Fabregas, Silva, De Bruyne, Bodelwjin, Havertz, Chamberlain, Solheim¹, Caio Gomes¹, Demirci¹, Jay Allen¹, Mbarga¹, Benitez¹, Eyadama¹ e Helal¹;
Atacantes: Nketiah, Häland, Saka, Greenwood, Mané, Gbagho¹, Ayassou¹, Edson Reis¹ e Feijó¹.

¹jogador de categoria de base

Pela lista acima, 33% dos jogadores foram promovidos das categorias de base, demonstrando a transformação e rejuvenescimento do elenco.

O NOVO PIRLO

Palavras de Francesco Totti: "Tonali irá se tornar um dos melhores meio-campistas centrais do mundo, como Gerrard, De Rossi ou Lampard. Ele é uma mistura de Pirlo com Gattuso. Tem tudo que um jogador pode ter. Tem uma incrível mudança de ritmo, é tecnicamente bom e sempre está campo, tanto em jogos importantes quanto nos mais fáceis”.

Il Capitano está coberto de razão. O garoto italiano impressionou o mundo dado seu talento e semelhança física com Andrea Pirlo. Ao passo que o mundo carece do talento do aposentado meia, Sandro Tonali ganhou destaque.

Com poucos jogos na Serie A fora disputado por todos os times gigantes do planeta - mas desembarcou em Nottingham, para jogar no time multi campeão de Castro. Como um líbero, vem encantando o mundo com passes curtos, lançamentos e assistências precisas - foram 6 na última temporada, ótimo número para quem passa 90% do tempo no campo de defesa.

Nascido em 2000 e com 1,81m, tem um pé-direito já novamente desejado por outros clubes, mas garante que só sai se for expulso do clube. Peça fundamental de Castro, é cria do Piacenza, mas no Brescia que ascendeu profissionalmente.

Sandro Tonali já disputou duas temporadas pelo Notts County, ambas titular absoluto no meio da zaga inglesa e completou 70 partidas. É um dos capitães do elenco junto com Eddie, Rose, Tagliafico e Cesc.

COPAS: COMMUNITY SHIELD, CARABAO CUP E FA EMIRATE CUP

Em sua terceira disputa consecutiva de Community Shield, o Notts bateu o West Ham, em jogo morno de abertura de temporada. Häland foi o autor do gol solitário do título. Foi a única jornada positiva em copas domésticas na temporada. Pela Carabao, eliminação do time juvenil para o Peteborough nos pênaltis; já pela FA, eliminação nas quartas perante o Arsenal.

PREMIER LEAGUE

Tetracampeão.

Favorito absoluto ao inédito ao tetracampeonato, o Notts County teve a jornada mais uma vez soberana. Jamais um time impôs uma dinastia tão forte na "Terra da Rainha" e jamais se imaginaria que isso viria de um time tão modesto.

Vindo de campanha invicta, a estreia em casa contra o Arsenal apenas mostrou que a sequência não parecia ter fim - 3x0 com hat-trick de Bukayo Saka.

Foram 34 rodadas invicto, numa sucessão positiva sem precedentes também na Liga. A derrota veio em casa, perante o Southampton, por 2x1.

Ao todo, mais de 72 partidas sem sequer uma derrota no somatório dos anos.

Antes disso, o título foi entregue mais uma vez fora de casa. Não mais em Manchester, como nas três primeiras vezes, mas agora em Liverpool pela 31ª rodada. Contra os Reds, 2x0 com dois gols de Edson Reis, 17 anos e revelação santista, oriunda ainda da base da equipe.

O jogo da entrega de faixas, em sua terra natal porém como visitante - na 32ª rodada e já declarado campeão, o Notts bateu o seu maior rival, o Nottingham Forrest, por 2x0 e ergueu a taça perante olhares raivosos dos amantes locais. Um sabor nunca antes provado e que será, pra sempre, lembrado pelo lado azul da cidade.

A partida mais emblemática, em meio ao processo de renovação, certamente fora a vitória por 2x1 contra o Newcastle, no St. James Park. Por quê? Um time 100% homemade: Schofield; Bird, Rose e Brown; Nygard, Benitez, Caio Gomes e Arnaiz; Reis, Allen e Ayassou.

Foram ao todo 103 pontos, com 33 vitórias e apenas 1 derrota na competição. 116 gols feitos e 20 sofridos. Foram 33 pontos de vantagem para o vice-campeão West Ham. A escalação que mais se repetiu ao longo da jornada foi: Schofield; De Ligt, Tonali e Virgil; Hakimi, James, De Jong e Alaba; De Bruyne, Saka e Nketiah (C).

A dominância também ocorreu nos aspectos individuais: a tríplice artilharia (Saka | 23, Nketiah | 18 e De Bruyne | 14 gols) e a tríplice entre assistentes (Nketiah | 15, Häland | 12 e Alexander-Arnold | 9 passes diretos para gol). Schofield foi novamente o goleiro menos vazado e eleito melhor da competição, liderando a defesa que sofreu apenas 20 gols novamente em 38 jogos.

UEFA CHAMPIONS LEAGUE

A UCL era uma obsessão para o elenco. Depois do primeiro título e a queda dolorida para os catalães na última temporada, a retomada do protagonismo europeu fora determinado como o objetivo número um para o elenco.

A primeira fase colocou frente a frente: Notts County, Real Madrid, Monaco e Lokomotiv. Foram 18 pontos em 6 partidas, com 16 gols feitos e apenas 2 sofridos.

Desde a fase de grupos, Castro apostou numa rotação experiente, de caras que foram protagonistas nas duas campanhas já realizadas. Assim, escalou em 80% dos jogos a seguinte lista: Schmeichel; De Ligt, Rose e Hummels; TAA, Fabregas (C), David Silva e Tagliafico; Ramsey, Greenwood e Gbagho.

Com uma média de idade superior a 30 anos, não era um time veloz ou de contra-ataques. Todavia, era um time de toque de bola e superioridade em campo - o modo como ocupava espaços e encurtava as jogadas era impressionante. E, na ponta, a juventude, explosão e faro de gol de Gbagho, o maior nome das canteras de Nottingham.

Com a boa campanha, a equipe tinha o Atletico Madrid pelas oitavas. Na ida, um jogo super aberto em Madrid, trocação pura. Ao final, 2x1 para os ingleses, gols de Hakimi e Saka vindos do banco. A derrota em casa deixou Simeone desconfortável em seu estilo de jogo, pois precisaria atacar e propor o jogo em Nottingham. E o desconforto teve seu preço: 5x1 e placar agregado de 7x2 para os Magpies.

Já pelas quartas, mesma cidade. Pela terceira vez, o Notts County viajava a Madrid, agora pela segunda vez diante do Real. E uma aula em pleno Santiago Bernabeu: Greenwood abriu o placar e Gbagho, após pênalti em Fabregas, fechou o 2x0.

O jogo de volta, por sua vez, foi absolutamente insano e um dos mais memoráveis da recente história do clube. O Real Madrid abriu o placar logo no início do jogo. Com pouco mais de 30', pênalti para o Real, que levaria ao placar empatado no agregado. Após longa discussão, Schmeichel voou no canto direito para defender a cobrança. No rebote, De Ligt conectou Alexander-Arnold, que avançou até ele sofrer o pênalti. Gbagho foi e converteu. Ainda pressionando, após escanteio, Arnold puxou mais um contra-ataque e deixou Gbagho livre. 2x1, virada e classificação.

A Espanha, de onde fora castigado pela Federação e de onde sofrera o maior trauma como treinador do Notts, estava no caminho. E agora a chance de exorcizar o fantasma: Barcelona. O jogo de ida fora marcado para a Inglaterra. Um alto volume de jogo não estava sendo recompensado em gols. O Barcelona estava nitidamente assustado, mas exageradamente confiante que o medo não permitiria que algum gol saísse para o time da casa. Mas ele saiu: aos 94' em jogada de escanteio, De Ligt cruzou mal porém Greenwood buscou e, mesmo sem ângulo, marcou de cabeça o gol da vitória.

Na volta, a pressão barcelonista foi absurda. Incansável, o Notts se defendeu e se defendeu por 89'. No minuto seguinte, com um Barcelona cansado no canto do ringue, De Bruyne deu o golpe de misericórdia e garantiu o 1x0. Novamente 1x0, mas sentimento de goleada. O Notts estava na final da Champions League.

E na final, um confronto doméstico - West Ham, ironicamente em... Madrid.

Liderado por Lucas Moura, os londrinos atropelaram todos até a final, incluindo o poderoso Bayern nas semifinais.

Castro optou pelo seu time base na final, aquele mencionado, sem nenhuma alteração. Era a despedida de Hummels, Ramsey e David Silva do futebol. Imortais números 15, 16 e 21 respectivamente.

E impondo seu jogo cadenciado com esse sistema, o Notts teve 64% da posse de bola e 89% de precisão nos passes. Foram zero chutes permitidos na meta de Schmeichel. E dos seis chutes dos Magpies, um entrou - Gbagho marcou aos 43' em passe de David Silva. 1x0 pragmático e um título ensurdecedor.

Cesc Fabregas ergueu a taça aos 38 anos de idade. A experiência que se rendeu à juventude do grande destaque da equipe: Kossi Gbagho. Revelação da base que subiu quando do primeiro título inglês, teve a oportunidade como titular na competição e não fez feio: artilheiro da competição com 14 gols em 13 partidas e principal assistente com 6 passes. Greenwood, predestinado-mor, teve também participação relevante com 6 gols no torneio.

Experiência e juventude mesclados que levaram ao segundo título de Champions da história do clube. Desta vez, perfeito, com 13 vitórias em 13 jogos.

A REDENÇÃO 

A redenção foi antes de tudo junto à mídia. Durante o ano, nada pode se falar de mal. A gestão do vestiário foi perfeitamente executada, nada de errado vazava ao ouvidos maldosos de setores da mídia.

A escolha da comissão de ex-atletas promoveu a empatia necessária para o foco no objetivo. Com as peças escolhidas e um novo corpo técnico (fisiologistas, preparadores físicos, etc) determinado a alimentar Castro com todas as informações, todos os jogos foram a campo com intensidade máxima.

Estatisticamente, evolução nítida de muitos jogadores - Hakimi, Alexander-Arnold, De Ligt e Tonali, por exemplo.

Revelações como Edson Reis, Caio Gomes e Gbagho passando a ocupar lugares de destaque no elenco foram de encontro ao pedido da diretoria no começo da temporada.

O protagonismo fora mantido e retomado, em termos nacionais e internacionais. Premier League e UCL representaram o 17º e 18º títulos do Notts County em 7 temporadas sob a gestão de Castro. 

Um lucro de £527MM aos cofres do clube.

E DAQUI PRA FRENTE?

Com a paz instalada em Nottingham definitivamente, o objetivo é seguir vencendo tudo e transformando o time em homemade. O maior propósito agora é garantir um clube auto-sustentável com talentos próprios, capitalizados na globalização do futebol - brasileiros, argentinos, camaroneses, noruegueses e até... ingleses! 

Como parte do plano, David Silva assumirá como gerente e treinador da equipe de base, com o intuito de perenizar o estilo de jogo na cadeia de times do clube, a partir do sub-16.

Assim, no prazo de 3 anos, Castro precisa garantir 90% do elenco revelado na base. Impossível ou não?

Common Magpies!

Nenhum comentário:

Postar um comentário